Como um médico psiquiatra faz uma análise psiquiátrica e prescreve um tratamento?

Um médico psiquiatra, por ser um profissional da medicina com especialização em Psiquiatria, tem uma abordagem que integra aspectos biológicos, psicológicos e sociais. A “análise psiquiátrica” é mais abrangente do que uma análise puramente psicológica e a “prescrição de tratamento” pode incluir, além da psicoterapia, o uso de medicamentos.

Veja como esse processo geralmente ocorre:

1. Análise Psiquiátrica (Avaliação Clínica Detalhada)

A avaliação psiquiátrica é um processo minucioso que busca compreender o quadro clínico do paciente de forma holística. Inclui as seguintes etapas:

  • Anamnese Psiquiátrica (História Clínica e Psiquiátrica): Assim como em outras áreas da medicina, a conversa inicial é crucial. O psiquiatra coleta informações detalhadas sobre:
    • Queixa principal: O motivo que levou o paciente à consulta (ex: tristeza persistente, crises de pânico, dificuldade de concentração, alterações de humor).
    • História da doença atual: Início dos sintomas, intensidade, frequência, o que os desencadeia ou melhora, tratamentos anteriores e suas respostas.
    • História psiquiátrica pregressa: Episódios anteriores de transtornos mentais, internações psiquiátricas, tentativas de suicídio, uso de substâncias psicoativas (lícitas e ilícitas).
    • História médica pregressa: Doenças físicas preexistentes (diabetes, hipertensão, problemas de tireoide, etc.), cirurgias, alergias, medicações em uso para qualquer condição (pois algumas condições médicas ou seus tratamentos podem mimetizar ou exacerbar sintomas psiquiátricos).
    • História familiar: Presença de transtornos mentais, doenças neurológicas ou suicídios na família, que podem indicar predisposições genéticas.
    • História de desenvolvimento: Infância, adolescência, desenvolvimento cognitivo, social e emocional, desempenho escolar, relacionamentos.
    • História social e pessoal: Situação familiar, relacionamentos interpessoais, vida profissional/acadêmica, hábitos de sono, alimentação, nível de estresse, lazer, eventos de vida estressores (perdas, traumas).
  • Exame do Estado Mental: É uma parte fundamental da avaliação psiquiátrica. O psiquiatra observa e avalia sistematicamente diversos aspectos do funcionamento mental do paciente durante a consulta, como:
    • Aparência e comportamento: Higiene pessoal, vestimenta, postura, nível de atividade psicomotora (agitado, lento).
    • Discurso: Velocidade, volume, coerência, clareza.
    • Humor e afeto: Humor predominante (triste, irritado, eufórico), e a expressão externa desse humor (afeto congruente, embotado, expansivo).
    • Pensamento: Forma (organização, lógica) e conteúdo (presença de delírios, ideias obsessivas, ideias suicidas ou de autoagressão).
    • Percepção: Presença de alucinações (auditivas, visuais, etc.).
    • Cognição: Orientação (tempo, espaço, pessoa), atenção, concentração, memória, capacidade de abstração e juízo.
    • Insight (Juízo Crítico): Capacidade do paciente de compreender sua condição, a necessidade de tratamento e o papel do médico.
  • Exame Físico e Exames Complementares: Como médico, o psiquiatra pode realizar um exame físico básico e solicitar exames laboratoriais (ex: hemograma, função tireoidiana, dosagem de vitaminas, exames toxicológicos) e, em alguns casos, exames de imagem (ex: tomografia ou ressonância de crânio) para:
    • Descartar causas orgânicas para os sintomas psiquiátricos (ex: um problema de tireoide pode causar sintomas semelhantes à ansiedade ou depressão).
    • Monitorar a saúde geral do paciente, especialmente se houver uso de medicamentos.

2. Diagnóstico Psiquiátrico

Com base em todas as informações coletadas, o psiquiatra utiliza critérios diagnósticos estabelecidos em manuais como o DSM-5 (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais) da Associação Americana de Psiquiatria1 ou a CID-11 (Classificação Internacional de Doenças) da Organização Mundial da Saúde para chegar a um diagnóstico preciso.

O diagnóstico em psiquiatria é clínico, baseado na história e nos sintomas apresentados, e não em um único exame laboratorial ou de imagem.

3. Plano de Tratamento

Uma vez estabelecido o diagnóstico, o psiquiatra elabora um plano de tratamento que é geralmente biopsicossocial, ou seja, considera os aspectos biológicos (cerebrais), psicológicos (mentais, emocionais) e sociais do paciente. O tratamento pode incluir:

  • Farmacoterapia (Medicamentos): Esta é uma das principais ferramentas do psiquiatra. Ele pode prescrever:
    • Antidepressivos: Para depressão, transtornos de ansiedade, TOC, etc.
    • Ansiolíticos: Para aliviar a ansiedade (geralmente por tempo limitado).
    • Estabilizadores de humor: Para transtorno bipolar.
    • Antipsicóticos: Para esquizofrenia, transtorno bipolar com sintomas psicóticos, e em algumas situações, como potencializador de antidepressivos.
    • Estimulantes: Para TDAH.
    • O psiquiatra seleciona o medicamento, a dose e monitora os efeitos colaterais e a eficácia, ajustando o tratamento conforme a resposta do paciente.
  • Psicoterapia: O psiquiatra pode realizar psicoterapia ele mesmo, dependendo de sua formação e abordagem (ex: Terapia Cognitivo-Comportamental, psicoterapia psicodinâmica, etc.), ou, mais comumente, encaminhar o paciente para um psicólogo para a psicoterapia. Em muitos casos, a combinação de medicação e psicoterapia é a abordagem mais eficaz.
  • Orientações e Psicoeducação: Explicar ao paciente sobre seu diagnóstico, a natureza da doença, o propósito dos medicamentos, os possíveis efeitos colaterais e a importância da adesão ao tratamento. Isso empodera o paciente e a família no processo de recuperação.
  • Mudanças no Estilo de Vida: Aconselhamento sobre alimentação saudável, exercícios físicos, higiene do sono, manejo do estresse e evitação de substâncias nocivas (álcool, drogas).
  • Intervenções Específicas: Em casos mais graves ou refratários, o psiquiatra pode indicar outras intervenções, como:
    • Eletroconvulsoterapia (ECT): Em quadros de depressão grave refratária, catatonia, mania grave.
    • Estimulação Magnética Transcraniana (EMT): Para depressão resistente.
    • Internação psiquiátrica: Em casos de risco de vida para o paciente ou para outros, ou quando o tratamento ambulatorial não é suficiente.
  • Reabilitação Psicossocial: Em casos de transtornos mais crônicos, o psiquiatra pode orientar a busca por serviços de reabilitação que visam melhorar a funcionalidade e a reintegração social do paciente.

4. Acompanhamento

O acompanhamento regular é fundamental para monitorar a evolução do paciente, ajustar as medicações, lidar com recaídas e promover a recuperação a longo prazo. A frequência das consultas varia de acordo com a gravidade do quadro e a fase do tratamento.

Em suma, o psiquiatra, como médico, atua na interface entre o corpo e a mente, buscando o equilíbrio neuroquímico e o bem-estar psicológico do paciente, frequentemente em colaboração com outros profissionais de saúde mental, como psicólogos.

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