Semeadura e Confiança no Incerto: Eclesiastes 11:1-6 à Luz do Espiritismo

Sumário

 

O que significa “Lança o teu pão sobre as águas”?

 

A frase, retirada de Eclesiastes 11:1, é uma poderosa metáfora que transcende o significado literal de jogar alimento na água. Ela possui duas interpretações principais, que se complementam, especialmente sob a ótica da Doutrina Espírita:

  1. Generosidade e Caridade Desinteressada: É o convite para sermos generosos e praticarmos a caridade sem esperar retorno imediato ou saber de quem ele virá. O “pão” representa aquilo de mais valioso que temos (recursos, tempo, talentos, amor, auxílio); as “águas” simbolizam o campo da vida, que é incerto e vasto. A promessa de “depois de muitos dias o acharás” é a certeza de que nenhum bem se perde. O bem que fazemos retorna a nós, como bênção e mérito, nesta ou em futuras existências, conforme a Lei de Causa e Efeito.
  2. Ação com Fé e Diligência: Em um contexto agrário da época (como na semeadura no Rio Nilo que transbordava), a frase também significa agir com fé e diligência mesmo diante da incerteza. Semear o grão na terra alagada (ou seja, em condições que parecem desfavoráveis ou arriscadas) exige confiança de que, após a cheia, a colheita virá. É um alerta contra a inação e a procrastinação: é preciso plantar o bem hoje para garantir a colheita amanhã, mesmo sem ter o controle dos resultados.

Em resumo, é um princípio de confiança inabalável na lei da retribuição moral e espiritual, encorajando a semeadura do bem em todas as circunstâncias.

 

Eclesiastes 11: 1-6

 

 

Uma Visão de “Qohelet” sobre a Ação, a Caridade e a Reencarnação

 

Por um Estudioso Autodidata Espírita

Sumário

  1. O Livro de Eclesiastes: O Canto da “Vaidade” e o Convite à Reflexão
  2. Capítulo 11: Ações no Tempo Presente e a Lei de Causa e Efeito
  3. Eclesiastes 11: 1-6 Interpretado pela Lente Espírita
      1. Lança o teu pão sobre as águas, porque depois de muitos dias o acharás.
      1. Reparte com sete, e ainda até com oito, porque não sabes que mal haverá sobre a terra.
      1. Se as nuvens estão cheias, derramam a chuva sobre a terra; e caindo a árvore para o sul, ou para o norte, no lugar em que a árvore cair, aí ficará.
      1. Quem observa o vento, nunca semeará, e o que olha para as nuvens nunca segará.
      1. Assim como tu não sabes qual o caminho do vento, nem como se formam os ossos no ventre da mulher grávida, assim também não podes compreender as obras de Deus, que faz todas as coisas.
      1. Pela manhã semeia a tua semente, e à tarde não retires a tua mão, porque tu não sabes qual prosperará, se esta, se aquela, ou se ambas serão igualmente boas.
  4. Conclusão: A Confiança na Justiça Divina e a Sementeira do Bem

 

1. O Livro de Eclesiastes: O Canto da “Vaidade” e o Convite à Reflexão

 

Conhecido como o livro do “Qohelet” (que significa “o pregador” ou “o orador na assembleia”), Eclesiastes é uma das obras mais instigantes e filosóficas do Velho Testamento. Sua marca registrada é o refrão: “Vaidade de vaidades, tudo é vaidade” (hebel hebelim, em hebraico, frequentemente traduzido como “vapor”, “efêmero” ou “insignificante”).

Apesar de sua aparente melancolia, o livro não prega o pessimismo vazio. Ao contrário, o Qohelet convida à reflexão profunda sobre a transitoriedade da vida terrena e a busca por um sentido que vá além dos prazeres e posses passageiras.

Para o estudioso espírita, Eclesiastes ressoa de forma poderosa, pois a “vaidade” (hebel) que ele critica é, na verdade, a ilusão da vida exclusivamente material. O Qohelet intui o que a Doutrina Espírita confirma: a felicidade plena não é deste mundo (cap. V, item 20, de O Evangelho Segundo o Espiritismo), pois nossa verdadeira essência é o Espírito imortal. A repetição dos ciclos da natureza e o aparente destino comum a todos (“os justos e os ímpios”, o Qohelet observa) apenas enfatizam a necessidade de buscar a única coisa que perdura: a evolução moral do Espírito.

 

2. Capítulo 11: Ações no Tempo Presente e a Lei de Causa e Efeito

 

No capítulo 11, o tom de Eclesiastes se move da constatação da “vaidade” para um vigoroso chamado à ação imediata e desprendida. Sob o título “As previsões da prosperidade” ou, mais precisamente, “O Dever da Ação e da Caridade”, o Qohelet encoraja o indivíduo a agir agora, sem paralisar-se pela incerteza do futuro ou pela complexidade dos planos de Deus.

Essa seção é um hino à semeadura, uma exortação à diligência e, crucialmente, um poderoso endosso à Lei de Causa e Efeito, um pilar central da Doutrina Espírita. O Qohelet nos diz: não importa o que o amanhã traga, sua única garantia de colheita é a semeadura de hoje. Essa semeadura, interpretada à luz da vida imortal, é a sementeira do bem.

 

3. Eclesiastes 11: 1-6 Interpretado pela Lente Espírita

 

A seguir, transcrevemos e interpretamos cada versículo, extraindo a sua profundidade moral e o diálogo com os ensinamentos da Doutrina Espírita:

 

1. Lança o teu pão sobre as águas, porque depois de muitos dias o acharás.

 

Interpretação Espírita: Este é um poderoso convite à Caridade Ativa e Desinteressada. O “pão” representa o bem, o auxílio material, moral ou intelectual. “Lançar sobre as águas” simboliza dar sem esperar retorno imediato ou saber onde o bem irá parar. As “águas” são o oceano da vida, o campo de provas onde a incerteza domina. A promessa de “acharás depois de muitos dias” é a certeza da Lei da Caridade e da Justiça Divina. O bem que fazemos não se perde; ele retorna a nós, não necessariamente nesta vida, mas na economia da Justiça Perfeita de Deus, em vidas futuras (Reencarnação) e na melhoria de nosso estado espiritual (mérito). É o princípio evangélico de “dar de graça o que de graça recebestes”.

 

2. Reparte com sete, e ainda até com oito, porque não sabes que mal haverá sobre a terra.

 

Interpretação Espírita: A exortação à Generosidade Máxima e Abrangente. O número “sete” e “oito” denota a totalidade, a plenitude, sugerindo que a caridade deve ser feita a todos, sem distinção de credo, raça ou mérito aparente. O Qohelet justifica essa generosidade pela incerteza do futuro (o “mal que haverá sobre a terra”). Na visão espírita, essa incerteza se amplia com o conhecimento da pluralidade das existências. Não sabemos quais provas e expiações nos aguardam na atual ou nas futuras encarnações. A caridade de hoje é o capital moral que amanhã nos garantirá amparo e benevolência, seja no sofrimento ou na transição para a vida espiritual, atenuando a aspereza das futuras provas.

 

3. Se as nuvens estão cheias, derramam a chuva sobre a terra; e caindo a árvore para o sul, ou para o norte, no lugar em que a árvore cair, aí ficará.

 

Interpretação Espírita: Este versículo aborda a Fatalidade Relativa e a Imutabilidade das Leis Naturais. A primeira parte (“nuvens cheias”) ilustra a Lei de Causa e Efeito em ação no plano material: uma causa natural inevitavelmente produz seu efeito (nuvens = chuva). A segunda parte (“caindo a árvore”) representa as consequências irreversíveis de nossas escolhas e a inevitabilidade da morte física. No momento da desencarnação (a queda da árvore), o Espírito é levado para a situação que construiu para si mesmo (“aí ficará”). O local e o estado do Espírito no mundo espiritual, ou a sua próxima encarnação, são determinados pelo seu padrão vibratório e moral, a “direção” que ele escolheu em vida.

 

4. Quem observa o vento, nunca semeará, e o que olha para as nuvens nunca segará.

 

Interpretação Espírita: Uma crítica direta à Inação e à Paralisia pela Dúvida. “Observar o vento” ou “olhar para as nuvens” é o símbolo do indivíduo que espera pelas condições ideais, pelo momento perfeito, ou que se detém nas incertezas da vida. O Qohelet adverte: a vida é movimento e a evolução exige ação. No Espiritismo, isso se traduz no convite à Reforma Íntima e ao Trabalho no Bem. A desculpa da fatalidade, da falta de oportunidades ou da espera por uma “intervenção divina” isenta de esforço é condenada. É preciso ter Fé Raciocinada e trabalhar, sem se deixar abater pela complexidade da vida ou pela incompreensão dos desígnios divinos. A semente de hoje é a virtude cultivada; a colheita é o progresso espiritual.

 

5. Assim como tu não sabes qual o caminho do vento, nem como se formam os ossos no ventre da mulher grávida, assim também não podes compreender as obras de Deus, que faz todas as coisas.

 

Interpretação Espírita: Uma lição de Humildade e Limitação do Conhecimento Humano. O Qohelet aponta para dois mistérios da Natureza: a imaterialidade do vento (sopro da vida, pneuma, Espírito) e o processo da formação da vida (reencarnação). O Espírito encarnado não pode compreender plenamente os desígnios de Deus. O “caminho do vento” pode ser visto como as manifestações do Espírito e as suas influências ocultas; a formação do corpo, como o mistério da ligação do Espírito à matéria na reencarnação, processo que é guiado pelas Leis Divinas, e não pelo capricho humano. Este versículo nos lembra que nossa visão é limitada e que a Confiança em Deus e em Suas leis perfeitas é o caminho mais sábio.

 

6. Pela manhã semeia a tua semente, e à tarde não retires a tua mão, porque tu não sabes qual prosperará, se esta, se aquela, ou se ambas serão igualmente boas.

 

Interpretação Espírita: A síntese da Diligência e da Perseverança no Bem. “Pela manhã” e “à tarde” abrange todo o ciclo da vida, do início (juventude e vigor) ao fim (velhice ou esgotamento das forças). A mensagem é clara: o trabalho no bem deve ser incessante. Sejamos diligentes na semeadura de boas ações, da paciência, do estudo e da caridade, pois não sabemos qual esforço resultará em maior progresso para nós ou para o próximo. A caridade que parece insignificante hoje pode ser a chave de nossa felicidade futura. O mérito reside no esforço contínuo e na boa vontade. O resultado final, a prosperidade do “fruto”, cabe unicamente a Deus e Suas leis.

 

4. Conclusão: A Confiança na Justiça Divina e a Sementeira do Bem

 

Eclesiastes 11: 1-6 é um tratado atemporal sobre o dever de agir e semear o bem, mesmo diante da incerteza do amanhã. À luz da Doutrina Espírita, essa passagem ganha um significado ainda mais profundo e consolador.

A incerteza da vida terrena é a oportunidade de exercer o Livre-Arbítrio e a Caridade Desinteressada. O “pão lançado sobre as águas” é o investimento no nosso capital espiritual. E o conhecimento de que “a árvore cairá onde estiver” nos exorta à vigilância e à transformação moral, pois o estado de nosso Espírito determinará nossa posição na vida após a morte e o gênero de nossas futuras reencarnações.

Sejamos os semeadores incansáveis, confiando que a Lei de Justiça, Amor e Caridade garantirá a colheita no tempo certo de Deus. É o que nos ensina o Qohelet: a verdadeira prosperidade não está nos bens que se evaporam, mas nas obras do amor que perduram para a eternidade.

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