A Lei nº 11.638/07, que alterou e revogou dispositivos da Lei nº 6.404/76 (Lei das Sociedades por Ações), promoveu significativas mudanças na estrutura e na apresentação das demonstrações financeiras no Brasil, visando à convergência com as normas internacionais de contabilidade (IFRS).
No que se refere ao Patrimônio Líquido (PL), a Lei 11.638/07 ratificou e detalhou seus componentes, que representam a participação residual dos proprietários nos ativos da entidade, após a dedução de todos os passivos. Em termos simples, é a riqueza líquida da empresa.
Os principais componentes do Patrimônio Líquido, conforme a Lei nº 11.638/07 (e complementações da Lei nº 11.941/09 e Pronunciamentos Contábeis – CPCs), são:
1. Capital Social
O Capital Social representa o valor total dos recursos que os sócios ou acionistas investiram na empresa. É a base financeira para o início das operações e o desenvolvimento dos negócios.
- Montante Subscrito: É o valor que os acionistas se comprometeram a integralizar (entregar) à sociedade.
- Montante Integralizado (Realizado): É a parcela do capital subscrito que já foi efetivamente entregue à empresa, seja em dinheiro, bens ou direitos.
- Capital a Realizar (Não Integralizado): É a parte do capital subscrito que ainda não foi entregue pelos acionistas. É uma conta retificadora do capital social, ou seja, reduz o valor total subscrito para mostrar o valor que já está disponível na empresa.
2. Reservas de Capital
As Reservas de Capital são valores recebidos pela empresa que não decorrem de receitas ou lucros gerados pelas operações, mas sim de outras transações que afetam diretamente o Patrimônio Líquido. Essas reservas não transitam pelo resultado do exercício. Exemplos comuns incluem:
- Ágio na Emissão de Ações: Valor recebido acima do valor nominal das ações na sua emissão. Isso ocorre quando a demanda pelas ações é alta e os investidores pagam um preço superior ao valor de face.
- Produto da Alienação de Partes Beneficiárias e Bônus de Subscrição: Recursos obtidos pela venda desses títulos.
- Reserva de Doações e Subvenções para Investimento: Valores recebidos por doações ou subvenções governamentais destinadas a investimentos específicos da empresa.
3. Reservas de Lucros
As Reservas de Lucros são constituídas pela apropriação de parte dos lucros líquidos do exercício. Seu objetivo é reter parte dos lucros na empresa para diversas finalidades, como investimentos, expansão ou proteção do capital. As principais reservas de lucros são:
- Reserva Legal: É uma reserva obrigatória por lei (art. 193 da Lei das S.A.) que visa a proteger o capital social e garantir a solidez financeira da empresa. É constituída por 5% do lucro líquido do exercício, até que seu saldo atinja 20% do capital social.
- Reserva Estatutária: Criada por disposição no estatuto social da empresa, com finalidade ou limite de constituição definidos. O estatuto pode prever a destinação de parte do lucro para essa reserva.
- Reserva para Contingências: Destinada a compensar, em exercício futuro, a diminuição do lucro decorrente de perdas julgadas prováveis e de valor estimado. É uma forma de prever e provisionar recursos para eventos futuros incertos.
- Reserva de Incentivos Fiscais: Constituída a partir de lucros decorrentes de doações ou subvenções governamentais para investimentos, conforme previsto em lei.
- Reservas de Lucros a Realizar: Contabiliza os lucros ainda não realizados financeiramente, como aqueles decorrentes de ajustes a valor justo de ativos, que ainda não geraram fluxo de caixa. Essa reserva impede a distribuição de dividendos sobre lucros que ainda não são “dinheiro no caixa”.
- Retenção de Lucros (ou Reserva para Expansão): Parte dos lucros que a assembleia geral dos acionistas destina à retenção na empresa, com um plano de investimentos aprovado.
4. Ajustes de Avaliação Patrimonial (AAP)
Os Ajustes de Avaliação Patrimonial são contas que registram as contrapartidas de aumentos ou diminuições de valor atribuído a elementos do ativo e do passivo, em decorrência da sua avaliação a valor justo (também conhecido como valor de mercado), enquanto não forem realizados pela empresa.
A Lei nº 11.638/07 enfatizou a importância da avaliação a valor justo, e os AAP surgem para demonstrar essas diferenças entre o custo histórico e o valor justo de determinados ativos e passivos. Por exemplo, se a empresa tem investimentos em outras companhias que são avaliados pelo método da equivalência patrimonial e o valor justo desses investimentos aumenta, essa variação positiva é registrada nos Ajustes de Avaliação Patrimonial até que os investimentos sejam vendidos ou haja outra forma de realização.
5. Ações em Tesouraria
As Ações em Tesouraria representam as ações de emissão da própria companhia que são adquiridas por ela mesma. Essa aquisição pode ocorrer por diversos motivos, como para cancelamento, para serem vendidas posteriormente ou para programas de remuneração de empregados. As ações em tesouraria são apresentadas como uma dedução do Patrimônio Líquido, pois representam uma parcela do capital social que a empresa readquiriu, e enquanto estiverem em tesouraria, não têm direito a voto ou a dividendos.
6. Prejuízos Acumulados
Os Prejuízos Acumulados representam o resultado negativo da empresa que não foi absorvido por lucros acumulados ou reservas. Conforme a legislação, os prejuízos devem ser obrigatoriamente absorvidos pelos lucros acumulados, pelas reservas de lucros e, se necessário, pelas reservas de capital, nesta ordem. A conta de prejuízos acumulados só é apresentada no Balanço Patrimonial quando não há reservas suficientes para absorvê-los.
A Lei nº 11.638/07, ao lado de outras legislações e pronunciamentos contábeis, modernizou a estrutura do Patrimônio Líquido, tornando-a mais alinhada às práticas internacionais e oferecendo maior transparência sobre a situação patrimonial e financeira das empresas.